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Nostalgias em Disputa: As Desordens do Tempo nos Programas de Governo de Lula e de Bolsonaro em 2022
Nostalgias in Dispute: The Disorders of Time in Lula's and Bolsonaro's Government Programs in 2022
Nostalgias en Disputa: Los Desórdenes del Tiempo en los Programas de Gobierno de Lula y Bolsonaro en 2022
Revista Comunicando, vol. 12, núm. 1, e023012, 2023
Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação

Comunicação Política

Revista Comunicando
Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação, Portugal
ISSN: 2184-0636
ISSN-e: 2182-4037
Periodicidade: Semestral
vol. 12, núm. 1, e023012, 2023

Recepção: 16 Novembro 2022

Aprovação: 28 Abril 2023

Publicado: 02 Maio 2023

Resumo: Este trabalho propõe uma reflexão sobre as formas de vivenciar o tempo e a política a partir da análise dos discursos dos candidatos à presidência da República no Brasil no ano de 2022. Com base na revisão teórica da articulação tempo, subjetividade e pertencimento, particularmente no campo da política, o artigo tem como objetivo empreender uma revisão sistemática das diferentes formas de acionar o passado, de modo a compreender como a dimensão do vivido é capaz de alimentar diferentes faces da esperança. Além da revisão bibliográfica, a pesquisa se concentra nos programas de governo dos dois candidatos mais bem colocados no pleito, disponíveis nos sites das campanhas. A investigação busca refletir sobre o entrelace entre sentimentos do passado e do futuro, verificando o rendimento teórico do debate para a sociologia política com ênfase na articulação tempo e emoções. No plano dos resultados encontrados, verificamos como os discursos das candidaturas acionam passados ligados a pertencimentos e a propósitos, nostalgias projetadas ao futuro.

Palavras-chave: Sociologia Política, Discurso, Nostalgia, Crítica da Modernidade .

Abstract: This work proposes a reflection on the ways of experiencing time and politics based on the analysis of the speeches of the candidates for the presidency of the Republic in Brazil in the year 2022. Based on the theoretical review of the articulation of time, subjectivity and belonging, particularly in the field of politics, the article aims to undertake a systematic review of the different ways of triggering the past to understand how the dimension of the lived is capable of feeding different faces of hope. In addition to the bibliographical review, the research focuses on the government programs of the two best-placed candidates in the election, available on the campaigns' websites. The investigation seeks to reflect on the intertwining between feelings of the past and the future, verifying the theoretical yield of the debate for political sociology with an emphasis on the articulation of time and emotions. In terms of the results found, we demonstrated how the candidates' speeches trigger pasts linked to belongings and purposes, nostalgia projected to the future.

Keywords: Political Sociology, Speech, Nostalgia, Critique of Modernity.

Resumen: Este trabajo propone una reflexión sobre las formas de experimentar el tiempo y la política a partir del análisis de los discursos de los candidatos a la presidencia de la República en Brasil en el año 2022. A partir de la revisión teórica de la articulación del tiempo, la subjetividad y la pertenencia, particularmente en el campo de la política, el artículo se propone realizar una revisión sistemática de las diferentes formas de desencadenar el pasado, con el fin de comprender cómo la dimensión de lo vivido es capaz de alimentar diferentes rostros de esperanza. Además de la revisión bibliográfica, la investigación expone y se enfoca en los programas de gobierno de los candidatos mejor posicionados en la elección, disponibles en los sitios web de las campañas. La investigación busca reflexionar sobre el entrelazamiento entre sentimientos del pasado y del futuro, verificando el rendimiento teórico del debate para el campo de la sociología política con énfasis en la articulación del tiempo y las emociones. En cuanto a los resultados encontrados, verificamos cómo los discursos de los candidatos desencadenan pasados ligados a pertenencias y propósitos, nostalgias proyectadas al futuro.

Palabras clave: Sociología Política, Discurso, Nostalgia, Critica de la Modernidad.

1. Introdução

O texto apresentado a seguir traz os resultados de uma revisão sistemática dos programas de governo onde foram identificados determinados Discursos dos candidatos à presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro no ano eleitoral de 2022. A pesquisa consiste em analisar como as referências discursivas a múltiplas temporalidades apontam para diferentes registros da esperança, de modo a configurar uma gramática dos sentimentos ligados ao porvir na política. Como os programas de governo presidenciais, através de suas estratégias discursivas, acionam nostalgias projetadas em novas expectativas políticas? – essa é a pergunta chave da pesquisa.

Para a análise das temporalidades nos discursos eleitorais, o texto toma como referência teórica o pensamento crítico da passagem do século XX ao século XXI voltado a uma análise das formas subjetivas de apreensão do tempo no contexto das tecnologias da comunicação e de uma tendência à aceleração dos fluxos informacionais. Nesse ponto, procuramos compreender: (a) a relação entre a realidade e sua representação, , de modo a estabelecer formas específicas de autogerenciamento do tempo; (b) a reelaboração individual do tempo, tanto em suas formas de percepção, produzindo resistências, quanto através da linguagem, desarrumando ordens lineares; (c) a articulação entre tempos e pertencimentos, assim como as formas de apropriação política no contexto das democracias contemporâneas. Através dessa organização, buscamos encontrar o chão analítico a partir do qual procuramos compreender os acionamentos do tempo nas candidaturas presidenciais.

2. Metodologia

A metodologia da pesquisa inclui a revisão bibliográfica sobre as percepções do tempo nas ciências sociais e o exame dos textos dos programas de governo, em particular, as referências ao passado, ao presente e ao futuro, seguido de reuniões nas quais os dados foram organizados e discutidos. Do ponto de vista metodológico, a proposta é a de explorar as relações entre os discursos e a dinâmica de expectativas sociais, nos termos de Fairclough (2016), uma metodologia capaz de entrelaçar textos e crenças em uma perspectiva transdisciplinar (van Dijk, 2012), alinhado aos pressupostos da Análise Crítica do Discurso (ACD), que compreende a linguagem como articulada a práticas sociais, de modo a configurar disputas de poder inscritas na produção discursiva (Fairclough, 2016). É com base nessa abordagem que a presente análise se desenvolve.

Finalmente, verificamos as incidências a tempos distintos nos programas de governo e refletimos sobre o modo pelo qual diferentes temporalidades são acionadas como forma de alimentar expectativas na política. Para essa pesquisa, tomamos como pressuposto a ideia de um tempo estilhaçado, no qual o sujeito conectado a uma rede de informações é capaz de reelaborar formas descontínuas de vivenciar temporalidades específicas e desencaixadas de um tempo objetivo, ordenado linearmente (Castells, 2000).

3. Interstícios dos Referenciais de Verdade e de Liberdade: Confusões Temporais

Em 1967, Guy Debord (1997) indicou como a política, a cultura, a economia e a vida social foram dominadas pela forma do espetáculo, uma denúncia da redução da vida moderna à representação cujo impacto afetaria o pensamento crítico. Cinquenta anos depois, Byung-Chul Han (2017) identificou o sofrimento psíquico provocado pelo esgotamento de um modelo de sociedade baseado nos princípios do desempenho individual autossuficiente e da hiperatividade positiva. De acordo com sua crítica, a pós-modernidade traria um tipo de liberdade segundo a qual o sujeito se posiciona distante de qualquer instância de coerção, no entanto, se inscreve como projeto livre, calcado na crença em sua capacidade de reinvenção e em seu próprio desempenho. Para Han (2017), o Século XXI é o tempo das formas de subjetivação e sujeição provocadas por essa imagem da livre autossuficiência individual:

encontramo-nos em uma situação paradoxal. A liberdade é a antagonista da coerção. ... Ora mas essa liberdade que deveria ser o contrário da coação produz ela mesma coerções. Doenças psíquicas, como depressão e burnout são expressões de uma profunda crise da liberdade: são sintomas patológicos de que hoje ela se transforma muitas vezes em coerção. O sujeito do desempenho, que se julga livre, é na realidade um servo absoluto na medida em que, sem um senhor, explora voluntariamente a si mesmo. ... O sujeito absolutiza a vida nua e trabalha. (p. 10)

A partir dessas considerações, cabe indicar duas características da cultura, dentro das pretensões de pensar o tempo: (a) a relação confusa entre o indivíduo e as redes de informação, atravessada por práticas de consumo, compartilhamento de conteúdos, expressão de opiniões, desejos, diversão e polêmicas no bojo das redes sociais; (b) o esgotamento individual provocado pelo autogerenciamento da equação sobrecarga profissional versus escassez de tempo, um cotidiano cuja manutenção muitas vezes é feita por uma espécie de cultura motivacional, composta por recursos que vão desde coaches, passando por consultórios, livros de autoajuda até o uso de psicofármacos[1].

Tomando essa crítica da sociedade contemporânea como referência, também formulada em outros autores[2], podemos situar um contexto no qual o indivíduo se encontra sem a âncora do passado seguro e sem a bússola de orientação ao porvir. Seja pelo argumento da superficialização acrítica em Debord (1997), seja pelo argumento da positividade danosa em Han (2017), as teses do bloqueio das capacidades de resistência desaguam em uma série de diagnósticos sobre certa concepção de tempo na contemporaneidade. Para Debord (1997), o espetáculo desorganiza anarquicamente as noções do verdadeiro e do falso. Para Han (2017), a oposição entre liberdade e coação se funde na imagem de uma liberdade autorreferenciada, o indivíduo como empresário de si mesmo: “o explorador é ao mesmo tempo explorado”. (p. 30)

É no contexto de apagamento das fronteiras entre o real e o falso e entre a liberdade e a submissão que os discursos políticos direcionam de maneira particular as propostas de futuro no Brasil do Século XXI. Assim, o tempo dos discursos políticos não seria verdadeiro ou falso, nem mesmo libertário ou tirano. De acordo com a nossa hipótese, o tempo do discurso político é disparatado, remete simultaneamente ao revolvido, ao imediato e ao que esperamos do futuro, em movimentos caóticos. Nesse sentido, o artigo apresenta os resultados de uma Análise Crítica do Discurso (ACD) aplicada aos programas de governo dos candidatos à presidência da República durante as eleições brasileiras de 2022. Com isso buscamos saber quais as estratégias discursivas utilizadas, refletir acerca da relação estabelecida entre essas estratégias e o tempo. A análise não inclui os discursos dos candidatos em outras ações, como debates ou propagandas. O recorte na análise dos programas se justifica em função da centralidade do material, síntese do posicionamento do candidato, referência para as suas atividades de campanha e ponto de partida ao que pretende realizar no futuro, caso seja eleito. Antes, porém, procuramos compreender o modo pelo qual a consciência se conecta a diferentes temporalidades, movimento que permite verificar como as defesas discursivas das candidaturas acionam o tempo.

4. Considerações Sobre as Percepções do Tempo

A tripartição do tempo se organiza pela divisão sequencial em passado, presente e futuro, um referencial concentrado no instante em que se vive, de fato. Há, ainda, uma dimensão dual - de tempos uno e múltiplos, concentrados na mesma experiência, a qual foi objeto privilegiado de reflexão na história do pensamento. Na Era Clássica, o tempo que flui irrecuperável em Heráclito, ou o tempo uno em Parmênides - os primórdios desta discussão (Jaeger, 2013).

Nesse texto, pretendemos apresentar uma discussão a respeito do processo de fragmentação das percepções de passado, presente e futuro a partir do qual podemos compreender o fenômeno de recuperação do passado como estratégia discursiva dos candidatos à presidência. O desencaixe entre uma noção de fluxo temporal linear e organizado em contraste com as formas subjetivas de vivenciar o tempo parte do debate anterior que buscou compreender as relações entre as emoções, as temporalidades e a política (Coelho & Oliveira, 2020). Na ocasião, exploramos formas específicas de vivenciar o passado, o presente e o futuro, tomando como referências as pesquisas de David Berliner (2015) e de Vincent Crapanzano (2014). A discussão a respeito da relação entre o tempo e as emoções na política abre caminho para uma análise da produção discursiva entre candidaturas, no contexto de disputas eleitorais (Coelho & Oliveira, 2020).

No registro analítico, o vínculo entre o presente e o futuro se dá através de um processo de desdobramento, da ação consciente que se realiza no instante cujo sentido se projeta para um porvir. Constituinte do que se entende como tempo histórico, esse nexo temporal corresponde ao legado hegeliano deixado às sociedades modernas (Kojève, 2002, p. 349). Mais que um mero constructo teórico, a concepção de tempo futuro-centrada, nas palavras de François Hartog (2013), consagra um horizonte temporal para o qual as expectativas sociais, políticas e tecnológicas seriam apontadas, orientação que deu o tom da modernidade. Significa dizer que a era moderna concebe o futuro como sinônimo de progresso, na esteira do desenvolvimento científico-tecnológico orientado pela razão. A ruína desse regime de historicidade futurista ocorreria pela saturação das utopias emancipatórias, que acenavam com a ideia de progresso e expansão das liberdades, mas seriam frustradas pela realidade política e social, repleta de violências e de desigualdades (Brüseke, 1996).

Tomando como referência a tese de Reinhart Koselleck (2006) segundo a qual na era moderna ocorre um processo de distensão do espaço de experiência e do horizonte de expectativas a um presente hipertrofiado, Hartog (2013) identifica o que denomina de “regime presentista”. De acordo com essa concepção, o presente teria se tornado uma dimensão fechada em si, dilatada, a partir da qual o futuro e o passado são instrumentos de construção de universos simbólicos capazes de incidir sobre a realidade imediata:

o presentismo pode, assim, ser um horizonte aberto ou fechado: aberto para cada vez mais aceleração e mobilidade, fechado para uma sobrevivência diária e um presente estagnante. A isso, deve-se ainda acrescentar outra dimensão de nosso presente: a do futuro percebido, não mais como promessa, mas como ameaça; sob a forma de catástrofes, de um tempo de catástrofes que nós mesmos provocamos. (Hartog, 2013, p.15)

Se o centro de gravidade do tempo era o passado na era pré-moderna, tendo no conhecimento tradicional e na experiência ancestral as âncoras das ações, a modernidade deslocou esse centro referencial ao porvir, inspirada pela bússola do progresso. Não por acaso, a modernidade é a época na qual constituições foram redigidas, direitos foram ampliados e revoluções foram sonhadas (Brüseke, 1996). Com o declínio do projeto moderno, o futuro teria deixado de ser o topo do tempo, referência sobre a qual se depositavam as expectativas de progresso.

A partir dos anos 1960, as perspectivas de diluição de um tempo tripartido e vetorizado ganham corpo, um fenômeno tributário do esgotamento das grandes narrativas, como pontuou Jean-François Lyotard (1993). Outros autores desenvolveram essa crise da ordem do tempo, como a concepção de um presente amplo em Hans Gumbrecht (2012) e as aporias da experiência do tempo em Paul Ricoeur (2010), este último articulando as tensões entre o tempo da alma, de Santo Agostinho e o tempo lógico, de Aristóteles. Ricoeur (2010) remonta o impasse conceitual da ideia de tempo na medida em que aponta o contraste entre o tempo interior, da vida, e o tempo exterior, da natureza. Tal aporia constitui uma dimensão simultânea de ser e não ser: “Que é, pois, o tempo? Se ninguém me perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei” (Agostinho, 1958, como citado em Ricoeur, 2010). Trata-se de um paradoxo cujo impasse não permite uma medição do tempo: “como pode o tempo ser, se o passado já não é, se o futuro ainda não é e se o presente não é sempre?” (Ricoeur, 2010).

De acordo com Ricoeur (2010), é somente através da linguagem que podemos experimentar o fluxo contínuo da vida, proposição que humaniza o tempo e o articula com uma estrutura de sentido. O autor compreende o tempo à luz de horizontes hermenêuticos, tendo a linguagem como articulador entre tempo e experiência humana. Segundo Ricoeur (2010), “o tempo torna-se humano na medida em que está articulado de modo narrativo, e a narrativa alcança sua significação plenária quando se torna uma condição da existência temporal”. (p. 93)

Em face a esse debate, podemos demarcar dois aspectos centrais no plano da argumentação. O primeiro se refere à ruptura do nexo entre o futuro e o progresso para uma dimensão que se apresenta como vazio ameaçador, isto é, a experiência do tempo presente se estilhaça, no que Krzysztof Pomian (1999) chamou de “pluralidade temporal”. Em segundo lugar, o paradoxo da experiência subjetiva e seus descompassos em relação ao tempo objetivo é reconciliado através da narrativa e sua capacidade de construir e exprimir identidades individuais e comunitárias. Dessa forma, podemos pensar nas pontes entre o tempo do espírito de Agostinho e o tempo cosmológico de Aristóteles. É essa tensão entre o tempo desordenado e o tempo ordenado, entre o tempo de si e o tempo do mundo que será tomado como pressuposto teórico para pensar aquilo que Agamben (2009) designou como a obscuridade do tempo na contemporaneidade:

o presente que a contemporaneidade percebe tem as vértebras quebradas. O nosso tempo, o presente, não é, de fato, apenas o mais distante: não pode em nenhum caso nos alcançar. O seu dorso está fraturado, e nós nos mantemos exatamente no ponto da fratura. Por isso somos, apesar de tudo, contemporâneos a esse tempo. (p. 65)

Em face a essa discussão teórica, importa argumentar que, no plano das subjetividades, o tempo não corre contínuo ou unidirecional, como um rio, mas realiza movimentos caóticos os quais levam e trazem experiências de passados e expectativas de futuro múltiplas, como um mar revolto. A partir desse redemoinho temporal e através da linguagem, a consciência se torna cada vez mais resistente e insubordinada a uma temporalidade objetiva, social. Tais considerações permitem compreender o modo pelo qual diferentes tempos estão sujeitos a revisões, reapropriações e revalorizações de acordo com interesses específicos. Assim, tal concepção de tempo permite pensar como se desdobra o tempo na política, bem como seu registro no plano das disputas de poder, como veremos a seguir.

5. Pertencimentos e Propósitos: O Tempo da Política na Comunicação

Se no pensamento analítico o tempo é um impasse lógico e na experiência subjetiva o tempo é instância contra a qual o indivíduo resiste, no campo das disputas políticas, o tempo aparece como elemento central para a vocalização de interesses e construção de laços coletivos. Na política, as expectativas de progresso e bem-estar projetadas correspondem a uma série de aspectos históricos e culturais constituintes de um povo, um arcabouço de memórias vinculadas a sentimentos de pertencimento e identidades. Em conferência proferida no Museu Nacional, nos anos 1980, Michel Pollack (1992) já falava de uma memória construída através de duas fontes, os acontecimentos pessoais e os acontecimentos vividos “por tabela” - aqueles eventos nos quais a pessoa não participou, mas os vivencia no imaginário, compartilhando com o grupo em que se sente pertencer (1992, p. 2). Nas linhas de Pollack, a memória é seletiva, construída individualmente e socialmente através de heranças, flutuações e disputas. Enquanto objeto de lutas, na medida em que constitui identidades vinculadas a valores, individuais e coletivos, a memória está sujeita a enquadramentos (Pollak, 1992).

Com o desenvolvimento das tecnologias de comunicação e ampliação do acesso, a informação jornalística se tornou ao longo do Século XX uma das mais robustas fontes de documentação histórica e de construção de memórias coletivas (Castells, 2000). O fluxo de informações que percorrem as múltiplas telas em torno do indivíduo indica um tempo acelerado, no qual a velocidade das notícias tende a desafiar a capacidade de organização das informações, do ponto de vista cognitivo (Castells, 2000). No contexto de aceleração[3], a guerra da informação e suas relações com o poder foram temas amplamente debatidos, entre os quais a crítica ao monopólio do fato histórico por parte dos meios de comunicação (Nora, 1995), a distorção e falseamento da realidade sob a forma do mito (Barthes, 1980) ou de simulacros (Baudrillard,1991) e a virtualização dos conteúdos da vida, que faz da experiência do tempo um “nó de tendências” vinculadas a uma situação (Levý, 2005). Nesses trabalhos reside a crítica ao potencial catastrófico das informações desregulamentadas, inscritas em fluxos temporais acelerados pelas tecnologias e pelas relações de produção e consumo próprias da economia capitalista[4].

Se os sentimentos ligados ao passado e acionados pelas memórias atravessaram processos de aceleração e intensificação, as identidades[5] se fragmentam de modo a desafiar os projetos totalizantes encampados pela globalização. A noção de identidades substancializadas ou fundadas em valores ligados ao passado encontra sua crítica nas teses da fragmentação (Giddens,1991), do fortalecimento de pertencimentos locais (Canclini, 2015; Hall, 1999) e da formação de coletividades vinculadas a uma percepção ou interesse comum (Bauman, 2003; Maffesoli, 2000). Do ponto de vista cultural, a entrada no século XXI decreta o fim dos esforços totalizantes, tais como a aproximação de distâncias e o encurtamento de tempos através da interconexão. No vácuo de sentidos e valores, surgem espaços de pertencimentos étnicos, locais, religiosos, regionais, fundamentados em experiências corporais, estruturas simbólicas e vivências territoriais. No contexto pós-colonial, cabe pensar a existência em termos de multiplicidade, diferença e variação - ideias compartilhadas por pessoas em espaços e tempos plurais. Assim, grupos ligados a sentidos de pertencimento podem ter fronteiras frágeis, apagadas ou bem definidas. Do mesmo modo, pessoas podem construir laços e desenvolver simpatias por tempos longínquos e não vividos (Canclini, 2015).

Canclini (2015) mostra como a América Latina é lugar privilegiado da sobrevivência de setores oligárquicos, grupos hegemônicos que fixaram alto valor de bens culturais inclusive de conteúdos controversos, tais como os monumentos e reportagens que enaltecem os feitos de colonizadores em uma discussão crítica de sua biografia. Para Canclini (2015), o tradicionalismo expresso sob a forma do patrimônio é a forma menos suspeita de instaurar valores, uma vez que os torna expressão de valor inquestionável, para além de classes, etnias ou grupos antagônicos: “frente à magnificência de uma pirâmide Maia ou Inca, de palácios coloniais, cerâmicas indígenas de três séculos atrás ... não ocorre a ninguém pensar nas contradições sociais que a expressam" (p. 160). Segundo o autor, o tradicionalismo é um nó entre realidade e representação, sustentado pelos símbolos sociais do passado que envolvem determinado grupo. Aparece como recurso do passado para tornar suportáveis as contradições do presente (Canclini, 2015, p. 166). Aqui o passado é resgatado como imaginário de ordem e harmonia, narrativa romantizada. Mas como se dá esse processo?

Um dos últimos ensaios de Bauman (2017), intitulado retrotopia, problematiza justamente a utopia do passado, baseado no pressuposto da crítica literária Svetlana Boym, de uma epidemia global caracterizada pela nostalgia no lugar da “epidemia frenética do progresso”, característica dos tempos modernos. Para a autora, recorrer ao passado seria um mecanismo de defesa fundamentado na “promessa de reconstruir um lar ideal que se encontra no núcleo de muitas poderosas ideologias atuais, tentando-nos a renunciar o pensamento crítico em prol do vínculo afetivo” (Boym, 2001, como citado em Bauman, 2017, p. 9). Bauman percorre a história recente, pontuando as expectativas de recuperação, na economia e no meio-ambiente, que reaparecem como questões insolúveis no século XXI, arranjo no qual os filhos crescem questionam cada vez mais a possibilidades de mundos melhores que o de seus pais. A persistência de problemas como o desemprego, a escalada de violência e a sensação de estagnação estariam por resgatar traços do cenário descrito por Hobbes (2020), como o isolamento e o medo. A ressaca provocada pelo excesso de promessas e de expectativas de futuro deslocou a referência de tempo das sociedades ao passado, dimensão temporal na qual novas fronteiras são traçadas, novos muros construídos e novas trincheiras cavadas. A frustração com o Estado e com a atuação de políticos convida a viver no interior dessas novas fronteiras, as tribos demarcadas pelas diferenças apontadas pelos seus integrantes, “usadas para justificar a superioridade de um grupo sobre o outro” (Bauman, 2017, p. 52). Nessa tendência, a sociedade se reorganiza em tribos que se relacionam em termos de superioridade e inferioridade, como no exemplo dos amantes de armas que veem aqueles que odeiam armas como inferiores e vice-versa. O autor aponta a existência de lados que desistiram de persuadir ou converter - “a inferioridade alienígena é e tem de ser incurável, condição inapagável, estigma indelével além de qualquer reparação” (Bauman, 2017, p. 53).

Qual o ponto dessa discussão que envolve o tempo e os pertencimentos no contexto de um ambiente marcado por uma realidade turva, atravessada por narrativas em disputa por legitimidade e impulsionada pelos meios de comunicação? Na campanha eleitoral brasileira de 2022, os dois candidatos mais bem colocados evocam formas específicas de acionar o tempo passado. É como se através das linhas dos programas de governo de Bolsonaro e Lula (Bolsonaro, 2022; Lula, 2022) pudéssemos observar propostas de passados em disputa, ora fundamentado por plano desenvolvimentista de resgate, ora mobilizado por um compromisso moral, ora voltado para uma memória coletiva de conquistas econômicas e ampliação de direitos. Nos dois casos, impulsionados por propósitos que se apresentam como “zona de conforto”, sentimentos de segurança vinculados ao passado, como veremos na próxima seção. Enquanto o futuro é o reino das liberdades, aberto a um campo de possibilidades desconhecidas, o passado é o reino do inalterável, dimensão sobre a qual o controle humano é limitado. Há uma dose de maleabilidade controlada desse passado, uma abertura à remodelagem sem riscos (Bauman, 2017, p. 62). Essa tendência é a que serve, da perspectiva da política da memória, a justificar nacionalismos exacerbados.

Em questões de fé, o propósito do debate não é a anuência, mas mostrar que o adversário é incuravelmente surdo e cego para as verdades, além de fatalmente viciado em premeditação maliciosa. O veredicto de más intenções torna as provas de veracidade redundantes. É muitíssimo recomendável não ouvir o adversário; ter empatia pelo adversário é uma asneira fatal, quase suicida. (Bauman, 2017, p. 66)

O diagnóstico de Bauman (2017) se refere à perda de esperanças no futuro e resgate do passado como meio de articulação política, dinâmica de acordo com a qual o tempo é reordenado em termos de recuperação de valores perdidos. Com o nexo entre os sentimentos de pertencimento vinculado ao passado e propósitos abertos a novos cenários, nos quais as heranças são remanejadas e enaltecidas como valor positivo, podemos argumentar que o tempo na política está sujeito a reordenamentos, particularmente voltados a acontecimentos vivenciados pessoalmente ou no imaginário, através de um conjunto de narrativas a respeito do que foi a vida em períodos anteriores.

6. O Tempo nos Programas de Governos dos Candidatos

O contexto da disputa presidencial de 2022, no entanto, ficou marcado por eventos atípicos, como o questionamento da imprensa e da legitimidade das pesquisas, os ataques às instituições como o Supremo Tribunal Federal, o contundente posicionamento político das Forças Armadas, além de episódios nos quais a divergência política culminou em brigas e até assassinatos entre cidadãos. Paralelamente, ilegalidades como a compra de votos, o descredenciamento dos debates e a proliferação de fake news acirravam a disputa, um cenário cujo impacto gerou um ambiente tenso entre a população.

No Brasil, os candidatos à presidência da República apresentam a cada eleição um plano de governo ao Tribunal Superior de Justiça Eleitoral (TSE), onde detalham seus objetivos e estratégias para governar o país. Em 2022 foram apresentados 13 pedidos de candidatura a presidente. As pesquisas Datafolha, Ipec e Quaest foram as de maior visibilidade durante o período eleitoral e convergiram ao indicar que Luiz Inácio Lula da Silva, Jair Bolsonaro, Simone Tebet e Ciro Gomes foram os candidatos mais bem colocados entre as intenções de voto. Apesar das pequenas variações nos índices, a ordem da disputase manteve no primeiro turno: Lula (48,43%) como candidato com maior intenção de voto, seguido, em ordem, por Bolsonaro (43,20%), Tebet (4,16%) e Ciro (3,04%). (Justiça Eleitoral Brasileira, 2022).

Esta análise se concentrou nos meses de agosto e setembro de 2022 e estabeleceu como recorte os programas de governo de Lula e Bolsonaro, respectivamente primeiro e segundo colocados de acordo com os índices de preferência do eleitorado. Inicialmente, em relação ao texto dos programas, realizamos leitura, análise, isolamento das referências temporais e discussões a respeito das linhas argumentativas de cada candidato. Em seguida, comparamos o modo pelo qual as propostas dos candidatos estabelecem vínculos a temporalidades específicas. Finalmente, procuramos mapear essas temporalidades e identificar como elas depõem sobre as expectativas na política brasileira.

A maneira como cada um dos programas aciona o passado e planeja o futuro são indícios de como acontece essa organização do tempo. Antes, porém, consideramos importante apresentar algumas características dos planos.

6.1. Luiz Inácio Lula da Silva

O primeiro plano de governo analisado neste trabalho é o do candidato e ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, representante da Coligação Brasil da Esperança, formada por: Partido dos Trabalhadores (PT), Partido Socialista Brasileiro (PSB), Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido Verde (PV), Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Rede Sustentabilidade (Rede), Solidariedade, Avante e Agir. Já na abertura do plano, temos a indicação do sentido de recuperação em relação ao que foi o Brasil no passado:

O sentido dessa união não é apenas trabalhar pela vitória eleitoral, mas, sobretudo, por um projeto que reconstrua o país no presente e o transforme para o futuro [ênfase adicionada]. Nosso horizonte é a criação de um projeto justo, solidário, sustentável, soberano e criativo para um Brasil que seja de todos os brasileiros e brasileiras. (Lula, 2022, p. 1)

O texto destaca a importância de uma retomada de um projeto de país e não deixa de ser interessante notar a combinação destas duas palavras, retomada e projeto. Uma que se refere a recuperar algo que ficou no passado, a outra que se direciona racionalmente para o futuro. Este é o leitmotiv[6] de todo o programa de governo do candidato Lula, voltado para construir um futuro que dê continuidade ao que foi realizado durante os governos do Partido dos Trabalhadores (2003-2016) e fechando o período da história recente, que vai de 2016 até o governo Bolsonaro, caracterizado como sinônimo de “desconstrução”, “atraso”, “isolamento” e “destruição”.

O governo Bolsonaro é apresentado como um tempo de retrocesso e crise institucional, período contrastado a outro passado da história brasileira, o governo do PT[7], de 2003 a 2016. No texto, o tempo é partido e segmentado, um recurso discursivo cuja direção aciona passados distintos entre si e os compara em termos de positividade e negatividade. O passado com Lula é identificado como um momento de avanços e “conquistas civilizatórias”, com a criação de políticas públicas para reverter discriminações históricas ou ainda o que reverteu o cenário da fome e da miséria em abundância. Resgata os números indicadores do crescimento econômico e o aumento da renda do brasileiro, além de investimentos em educação e habitação na primeira década do século XXI. Na linha argumentativa do programa, o passado é referência de desenvolvimento a ser recuperado, em oposição aos retrocessos recentes, uma vez que a marcha do crescimento fora interrompida pela eleição do governo opositor, expressado na figura de Bolsonaro.

As políticas sociais, conquistas civilizatórias de mais de uma geração, estão sendo mutiladas. Mulheres, negros e jovens padecem com o desmonte de políticas públicas, de modo a reforçar discriminações históricas. Populações indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais têm conquistas atacadas sem trégua. A saúde, a assistência social e a previdência sofrem ataques e retrocessos [ênfase adicionada]. (Lula, 2022, p. 2)

O discurso do programa de Lula assume um tom de lamento, como se algo tivesse se perdido, embora em vias de ser recuperado. O texto do programa de governo de Lula é conduzido por palavras como “reconstruir”, “restaurar” “renovar”, “resgatar”, “recuperar”, “reinserir”, “retomar”, “restabelecer”, “revogar”, “reverter”, “recompor” e “reformar”. Ao leitor, recria o cenário pretérito narrado em termos de progresso, que figura como memória aberta ao futuro, memória como alimento da esperança. No programa de Lula, o passado não é um passado qualquer: trata-se de um fluxo de desenvolvimento interrompido, um passado latente, motivação para a construção de um futuro que pode ser diferente do presente. O trecho abaixo exemplifica:

Diante desta situação, o primeiro e mais urgente compromisso que assumimos é com a restauração [ênfase adicionada] das condições de vida da imensa maioria da população brasileira – os que mais sofrem com a crise, a fome, o alto custo de vida, os que perderam o emprego, o lar e a vida em família. São esses brasileiros e brasileiras que precisamos socorrer, tanto por meio de ações emergenciais quanto por meio de políticas estruturantes, desde o primeiro minuto de um governo que será eleito para reconstruir [ênfase adicionada] o Brasil, superar a crise presente e resgatar [ênfase adicionada] a confiança no futuro. (Lula, 2022, p. 2)

O programa traça objetivos para temas como a redução da pobreza e das desigualdades, meio ambiente, retomada da indústria, educação e saúde. As propostas são endereçadas por verbos conjugados no futuro, indicando a necessidade de ação. O tom do texto é de que o presente não deve continuar como está. Mas, se até a metade da segunda década dos anos 2000, o futuro era uma marcha desenvolvimentista, superação do presente e do passado, após o governo Bolsonaro, o país precisa dar um passo atrás para voltar a olhar para o progresso.

Ao longo do texto, há o reforço de que o compromisso do plano de governo é de “defesa da igualdade, da democracia, da soberania e da paz” (Lula, 2022, p. 3). Os direitos humanos, a estabilidade econômica e o enfrentamento das mudanças climáticas também são citados com frequência e são norteadores das propostas políticas. Tais questões são apresentadas como pautas que seguiam rumo a um progresso que se perdeu com o impeachment de Dilma Rousseff e, consequentemente, o mandato complementar de Michel Temer, seguido da eleição Jair Bolsonaro, em 2018.

A esperança, termo que aparece no título da coligação, é recorrente no programa de governo de Lula. Aparece como evocação de um sentimento de realização daquilo que se deseja, como em “resgatando as forças, o otimismo, a criatividade e a esperança [ênfase adicionada] do povo brasileiro” (Lula, 2022, p. 1). Em outro ponto, o termo adquire o sentido de recuperação: “Mais do que nunca, o Brasil precisa resgatar a esperança [ênfase adicionada] na reconstrução e na transformação de um país devastado por um processo de destruição (Lula, 2022, p. 2); e finalmente, como impulso mobilizador capaz de traduzir um sentimento nacional, como em “o Brasil da esperança” (Lula, 2022, p. 3). A equação da esperança que a campanha busca criar é o de realização dos desejos do povo num futuro próximo, indicando que o ano de 2022 não cria essa sensação de prosperidade, fé e positividade. O particular no programa de governo de Lula é que a esperança, esse sentimento projetado ao futuro, é indissociável de um passado tomado como progresso. Aqui a dimensão do passado como o irrecuperável é descartada diante de uma promessa de revivescência daquilo que a vida foi um dia.

6.2. Jair Bolsonaro

O segundo plano de governo analisado é o do atual presidente Jair Messias Bolsonaro, da Coligação Pelo Bem do Brasil, formada pelo Partido Liberal (PL), Republicanos e Progressistas. O programa traz uma prestação de contas sobre o que foi realizado durante os quase quatro anos de governo e as indicações do que se pretende realizar, corroborando seu projeto de reeleição. Dividido em quatro capítulos, o documento abre com a apresentação dos “valores e princípios” do plano de governo; apresenta a “fundamentação estratégica” no segundo capítulo e o plano de governo no terceiro capítulo, com a especificação das áreas de atuação: economia, saúde, educação, segurança, infraestrutura, sustentabilidade ambiental e governança e geopolítica. O quarto capítulo, que fecha o programa, é reservado a uma conclusão.

Diferentemente do programa de Lula, o do candidato Bolsonaro foca em apresentar como valores e princípios a liberdade e a vida. Em relação à natureza semântica dessa liberdade os destaques são: liberdade econômica, liberdade religiosa, liberdade de expressão e liberdade para a defesa de direitos e liberdade para o uso responsável dos recursos naturais. Sobre a defesa da vida, apresenta como temas a dignidade para os menos favorecidos, a solidariedade social, o voluntariado e o equilíbrio socioeconômico.

O texto não apresenta diretrizes futuras, ou seja, não abre ou inicia com frases claras e curtas sobre o que pretende realizar, focando em apresentar dados e informações sobre os avanços realizados durante sua gestão, entre os anos de 2018 e 2022. Especificamente, o plano apresenta dados sobre a pobreza, o impacto da pandemia e da guerra entre Rússia e Ucrânia, argumentando em favor da eficiência do atual governo em reduzir o número de pessoas abaixo da linha de pobreza e indicando que a importância em dar continuidade a este modelo significará o aumento de receitas e melhores resultados, caso seja eleito.

O modelo de gestão dos governos que o antecederam é chamado pelo programa de Bolsonaro de “Ciclo da Pobreza”, enquanto o modelo de gestão atual é intitulado de “Ciclo da Prosperidade”. O primeiro “promove distribuição no começo e miséria a médio e longo prazo”, enquanto o segundo é caracterizado como “mais difícil no começo, mas se fortalece a médio e longo prazo” (Bolsonaro, 2022, p. 4). De acordo com o programa, o “ciclo da pobreza” estaria sujeito à ação da variável “corrupção”, capaz de redirecionar o os processos e alterar os rumos do país.

O tempo no texto do plano de governo de Bolsonaro aponta para o futuro, almeja modernização econômico-tecnológica, contudo, tem como âncora princípios e valores tradicionais. Máximas tais como “a família e o cidadão são a razão de ser do Estado” (Bolsonaro, 2022, p. 21) ressaltam que embora vislumbre o futuro, a proposta não abandona o projeto de fortalecer ideais considerados caros para o presidente e seu eleitorado. Desse modo, seu plano propõe um futuro vinculado ao que está acontecendo no presente, com vistas a garantir o processo de resgate de valores do passado.

De acordo com o programa de Bolsonaro, o passado recente se traduz em dois desvios: no plano político, a corrupção dos governos petistas teria atravancado o desenvolvimento; no plano cultural, os esforços internacionais em estimular processos de consolidação das democracias, ao exercer pressões em nome da promoção e garantia de direitos econômicos, políticos e sociais, teria ameaçado os valores tradicionais à medida em que incorpora perspectivas mais plurais no campo de disputas políticas.

Denominado pejorativamente como “globalismo”, esse processo estaria, do ponto de vista do programa de governo de Bolsonaro, produzindo a deterioração da vida social, o que justificaria um esforço de resgate de valores nacionais. Não por acaso, Bolsonaro ocupa um espectro ideológico alinhado à direita nacionalista cristã temperada com elementos discursivos próprios do liberalismo econômico. Tal orientação se traduz pelo lema de seu programa: “Deus, pátria, família e liberdade” (Bolsonaro, 2022, p.7), uma série de princípios voltados à restauração de um passado tradicional e ordenado, calcado em símbolos nacionais.

Busca-se dar continuidade ao Caminho da Prosperidade, com a implementação e a consolidação: da reforma econômica de cunho liberal; da permanência das políticas públicas sustentáveis e sem viés eleitoreiro; da retomada [ênfase adicionada] da moralidade pública pelo combate à corrupção; da paz social pela recuperação [ênfase adicionada] do sistema judicial e o de segurança pública; da retomada [ênfase adicionada] e valorização do civismo, do patriotismo, da instituição da família e dos valores morais e éticos; da desideologização do ensino; da liberdade de pensamento sem coerção ideológica de qualquer natureza; e do desaparelhamento ideológico da sociedade e do aparato do Estado, visando recuperar [ênfase adicionada] a coesão social. (Bolsonaro, 2022, p. 48)

Bolsonaro propõe uma costura discursiva na qual une os valores de um passado comprometido com o restabelecimento de uma suposta ordem moral, passado esse que seria a base potencialmente aberta a novos horizontes de desenvolvimento e progresso. O tom crítico do programa de Bolsonaro tem como pressuposto uma “conjuntura mundial incerta”, contra a qual o “Brasil precisaria proteger seus cidadãos” (Bolsonaro, 2022, p. 6).

Na fundamentação estratégica do programa, o projeto de prosperidade é etapa imprescindível para chegar ao objetivo, a “construção de uma grande nação”. Os termos “prosperidade” e “grande nação” são recorrentes, na maioria das vezes em caixa alta e em destaque, ressaltando a diretriz da proposta. A partir desse nexo, entendemos que a articulação entre prosperidade e grande nação é chave analítica a partir da qual o discurso do programa de governo de Bolsonaro evoca certo passado aberto a novas expectativas. Diferentemente de outros discursos, registrados em entrevistas e outros materiais ao longo dos anos, de acordo com os quais Bolsonaro enaltece o regime militar e faz comentários sexistas, homofóbicos e negacionistas, o programa de governo é um documento moderado. Por sua natureza, trata-se de um texto atravessado pelo crivo de técnicos, administradores e especialistas em comunicação, o que resulta em uma linguagem mais objetiva e prudente. Não obstante, é possível identificar referências temporais vinculadas ao que chama de valores e princípios. Ocorre que quando esses valores aparecem no contexto de uma proposta de “grande nação'', o programa de Bolsonaro tende a estabelecer uma tensão entre duas orientações centrais no final do Século XX: a oposição nacionalismo x globalismo.

7. Esboço de Análise da Ordem Temporal nos Programas de Lula e de Bolsonaro

Em sentido literal, vivemos um tempo único, o instante, aquele no qual todos nós estamos mergulhados. Diante dos múltiplos tempos que habitam os programas de Lula e de Bolsonaro, o que podemos inferir quando analisamos os programas de governo da situação e da oposição na corrida presidencial brasileira de 2022?

Existem múltiplas temporalidades na dimensão discursiva que orienta o embate entre os programas de governo de Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva. No programa de Lula, seu período de governo é acionado como tempo de progresso, em contraste aos “retrocessos” associados ao mandato de Bolsonaro. Lula propõe a retomada de um passado traduzido como progressista e marcado por conquistas econômicas e sociais, alocado temporariamente na primeira e parte da segunda década do século XXI. Essa polarização é invertida nas linhas do programa de Bolsonaro, cujo argumento aciona outras temporalidades mais complexas, evocadas como âncoras de ordem através da via comportamental.

Para Bolsonaro, o passado do governo Lula é o de corrupção política, enquanto o passado da cultura no século XXI, pluralista e progressista, é lido como o da deterioração dos valores tradicionais e patrióticos. Nesse registro, sua proposta prevê a recuperação de um passado mais remoto, assumido como tradicional e alocado em um imaginário de ordem que habitava os anos 1960, expressado na figura da família, da devoção religiosa e da ordem autoritária. Essa defesa dos valores pretéritos está enlaçada a um ideal de liberdade econômica, apresentados como pilares do desenvolvimento. De acordo com o programa do candidato, essa proposta de recuperação do passado de ordem começa a ser implementada a partir de 2018. Nas linhas argumentativas de Bolsonaro, esse passado é o alicerce sobre o qual a pátria deve retomar sua predisposição natural a se tornar uma grande nação através da recuperação do tradicionalismo.

Em Lula, a gramática do tempo vai da ordem à desordem, enquanto em Bolsonaro se inverte como da desordem à ordem. No discurso de Lula, o desenvolvimento econômico e conquistas sociais do passado deságuam na crise institucional e estagnação. No discurso de Bolsonaro, a corrupção política e recessão econômica despertam o projeto de recuperação da ordem através de uma série de signos tradicionalmente associados à ideia de grande nação. Lula argumenta que o país desordenou a partir de 2018; Bolsonaro argumenta que o reordenamento começou a partir da mesma data.

O tempo linear, sucessivo, encadeado, homogêneo é apenas uma das formas possíveis de leitura, inscrita em uma concepção racionalizada de ordem sequencial. Se o tempo da modernidade fora o do progresso, seguido pelo aprisionamento no presente, em face das decepções do século XX, o tempo da pós-modernidade é aquele virado ao avesso, esfacelado em textos e convicções. O tempo, como argumenta Ricoeur (2010), é acionado como linguagem, assim, se torna alvo de disputas e negociações. A vida política é multitemporal, policrônica, aberta a acionamentos temporais motivados por interesses políticos, tempos relidos, remontados e ressignificados.

Através da compreensão das temporalidades utilizadas nos discursos políticos e da construção das percepções de esperança e de expectativas resultantes do uso do tempo nos programas de governo, tendo como base teórica as relações entre os discursos e a dinâmica de expectativas sociais (Fairclough, 2016), a fragmentação da experiência (Castells, 2000) e a “utopia de passado” (Bauman, 2017), foi possível deduzir que no registro da subjetividade, os discursos políticos utilizam temporalidades como capital eleitoral.

No presente esforço analítico, podemos afirmar que a nostalgia de Lula é aquela que se refere ao seu governo anterior, enquanto a nostalgia de Bolsonaro é baseada na costura entre o horizonte imaginativo de valores tradicionais perdidos e o suposto projeto de recuperação desses valores, já em curso desde 2018. Em comum, o passado figura como referência para a construção dos programas de governo de ambos, tendência cuja direção vai de encontro ao diagnóstico de Bauman em relação à “utopia de passado”, recurso cuja função parece ser a de atenuar a sensação da perda de referenciais na cultura e a frustração causada pelo rearranjo dos pertencimentos em disputa na política.

8. Conclusão

A partir da análise dos programas de governo de Lula e Bolsonaro, deparamo-nos com acionamentos de passados distintos, porém ligados por um elemento comum: correspondem a âncoras de pertencimentos e propósitos (Bauman, 2017). Quando olhamos para os programas de governo dos candidatos, verificamos nostalgias em dois diferentes registros: a nostalgia de Bolsonaro, de pertencimentos histórico-político bem delineados versus a nostalgia de Lula, do movimento de abertura a novos pertencimentos. O passado é instrumento de articulação político-discursiva voltado a vocalizar interesses de diferentes grupos na sociedade, o sentido de pertencimento a uma memória única, nacional, tradicional, de um lado, e o sentido de pertencimentos múltiplos, pulverizados ao sabor do esgarçamento das democracias, do outro lado.

A crise de legitimidade dos discursos, discutida em seções anteriores pelo falseamento da realidade, em autores como Barthes (1980) e Baudrillard (1991), ou pela espetacularização em Debord (1997), responde ao questionamento generalizado sobre a veracidade das reportagens de jornal e dos índices de preferência eleitoral, nas pesquisas de intenção de voto.

O futuro, segundo os ideais iluministas, é o lugar da evolução, do progresso, do avanço tecnológico e por fim da libertação do homem das circunstâncias naturais. É um olhar para frente, despojando-se do que ficou para trás, um caminhar para a luz.

Com a superação das promessas frustradas de um futuro de progresso, e consequentemente, aprisionamento no presente, a retomada de um propósito político parece estar impulsionada mais pela recuperação do que a vida foi no passado do que pelo que a vida pode vir a ser. Essa não parece ser exclusividade do Brasil, mas um diagnóstico das democracias contemporâneas.

Nesse artigo, verificamos o modo pelo qual podemos compreender elementos do cenário político atual a partir das leituras de autores centrais para a sociologia das últimas décadas. Assim, a proposta é, de certa forma, também a de recuperar autores que fizeram diagnósticos do passado recente e ressaltar o rendimento atual de suas teses. Recurso metodológico suficiente para o pensamento de uma sociologia do tempo e seus recursos analíticos no campo da política.

As análises dos programas de governos dos candidatos justificam as conclusões, uma vez que o artigo busca compreender os termos e contextos utilizados pelos candidatos através da análise discursiva em relação ao tempo. O trabalho avalia nos discursos o acionamento do passado como instrumento de articulação político-discursiva voltado a vocalizar interesses de diferentes grupos na sociedade, o sentido de pertencimento a uma memória única, nacional, tradicional, de um lado, e o sentido de pertencimentos múltiplos, pulverizados ao sabor do esgarçamento das democracias, do outro lado.

No programa de Bolsonaro identificamos a especificidade do passado a ser recuperado, tempo costurado pelo discurso tradicional e habitado pelo imaginário de ordem. Seu programa propõe uma costura discursiva que une os valores de um passado comprometido com o restabelecimento de uma suposta ordem moral, passado esse que seria a base potencialmente aberta a novos horizontes de desenvolvimento e progresso. Já no programa de Lula, o passado é um fluxo de desenvolvimento interrompido, um passado latente, motivação para a construção de um futuro que pode ser diferente do presente.

Para essa pesquisa, consideramos as práticas heterogêneas do tempo e temporalidades diversas do ponto de vista da relação subjetiva entre o tempo e as respectivas expectativas políticas vinculadas. No registro da subjetividade, as temporalidades são múltiplas, simultâneas, encavaladas e plurais. Em nossa análise, o tempo é alvo do investimento discursivo de Lula e de Bolsonaro, candidatos diametralmente distintos não apenas em relação ao espectro ideológico que ocupam, mas também no modo pelo qual incorporam os ideais democráticos. Embora adversários, ambos acionam argumentos fundamentados na reconstrução de tempos passados ao sabor de projetos para os próximos quatro anos. Momento em que testemunhamos expectativas de futuros voltadas ao que a vida foi, tal como o anjo da história de Paul Klee[8].

Nas reflexões de Walter Benjamin (1987) a respeito do quadro Angelus Novus, o anjo da história está de costas, impelido ao futuro por uma tempestade que sopra e prende suas asas, permitindo apenas observar a catástrofe de eventos passados que se amontoam no decorrer da história. A partir da análise proposta, identificamos o modo pelo qual a dimensão do passado orientou os programas de governos de Lula e de Bolsonaro nas eleições brasileiras de 2022, momento no qual as nostalgias foram eixo articulador de novas expectativas de futuro.

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Notas

[1] Sobre esse ponto, Han formulou a tese da Sociedade do cansaço (2017). Para o debate sobre ouso de psicofármacos, autoajuda e demais recursos de manutenção do mal-estar, tomamos como referência teórica os trabalhos de LeBreton (2018) e Ehrenberg (2010).
[2] Para uma crítica da relação confusa entre o verdadeiro e o falso, os trabalhos de Baudrillard (1991) e McLuhan (1973) foram os nossos referenciais. Já no plano da crítica da pós-modernidade em termos de desorientação, do ponto de vista do indivíduo, recorremos aos trabalhos de Bauman (2001), de Giddens (1991), de Brüseke (2001) e de Beck (2010).
[3] Sobre a questão da aceleração, Paul Virilio (1996) chama atenção para o avanço das tecnologias avançadas e sua capacidade de impor novos ritmos de deslocamentos e novos fluxos de ideias. Chama de dromologia, do grego dromos, corrida, a era na qual as tecnologias reorganizam o tempo em termos de intensidade e aceleração.
[4] Aqui, tal crítica se refere ao legado deixado pelos estudos do Instituto de Pesquisa Social da Universidade de Frankfurt, que investigou os conteúdos midiáticos como instrumentos da Indústria Cultural voltados para uma padronização favorável ao consumo (ver Adorno & Horkheimer, 2006).
[5] Nesse ponto, tomamos como referência o conceito de identidade de Manuel Castells, baseado no pressuposto de uma identidade primária: “processo de construção de significado com base em um atributo cultural ou conjunto de atributos culturais inter-relacionados, o(s) qual(ais) prevalece(m) sobre outras fontes de significado". (Castells, 1999, p. 22)
[6] De uso corrente no contexto de análise das composições musicais e das obras literárias, o termo leitmotiv se refere à linha temática, percurso de argumentação através do qual o texto se desenvolve.
[7] O governo do Partido dos Trabalhadores corresponde aos governos de Lula (2003-2011) e de Dilma Rousseff (2012-2016), que teve seu mandato interrompido pelo processo de impeachment, Entre os anos de 2016 e 2018, a presidência da República foi assumida pelo vice de Dilma, Michel Temer, um mandato complementar que durou até as novas eleições, em 2018.
[8] Essa imagem se tornou para o pensamento crítico um ícone das frustrações diante das lutas por direitos no campo da política. (Benjamin, 1987)

Autor notes

Eduardo Moura Oliveira é mestre e doutor pelo Programa de Pós-Graduação em ciências sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Pesquisador do Projeto Cultura, Subjetividade e Emoções (Capes/PrInt), no Departamento de Antropologia do Instituto de Ciências Sociais-Uerj. Atua nas áreas de antropologia das emoções, teoria antropológica e antropologia política.
Marcela Frossard é Assessora de políticas sociais da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Doutorada em ciências sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, é mestre em ciências sociais pela Pontífica Universidade Católica do Rio de Janeiro e é bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro. É pesquisadora nas áreas de sociologia da educação, sociologia da violência, sociologia da juventude e políticas públicas.


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